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sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Um histórico de infrações ambientais, trabalhistas e de direitos humanos em Buriti, crônica de Mayron Régis

Nem ao resto do almoço os negros de Santa Cruz tinham direito. Se, porventura, o proprietário almoçasse só, a cozinheira melava o arroz e/ou a farinha na gordura da carne que ficara no fundo da panela.
Se, porventura, o proprietário almoçasse com sua esposa, esta estragava a gordura, pois jogava água na panela. Nessa época, Vicente de Paula morava com Maria Rita, sua esposa, na Caninana, povoado próximo a Santa Cruz. A moça que cozinhou durante muito tempo para a família do proprietário contou a história para o Vicente e sua esposa.

Nesse escorrer do tempo, o Incra desapropriou Santa Cruz, o proprietário faleceu e o Vicente e esposa se mudaram para o povoado Carrancas, lugar onde nasceram e se criaram. “Nós não somos retirantes!!!”, exclamaria Maria Rita no quintal de sua casa em Carrancas em setembro de 2014. Dessa forma, ela respondia ao André Introvini, proprietário da fazenda São Bernardo em Buriti. O André Introvini prometera terras nas Areias e na Sucupira caso o Vicente e a sua família abdicassem da propriedade onde moravam desde que saíram da Caninana. A dona Maria Rita também respondia ao senhor João Gabriel, pai do André, que denunciara o Vicente por, supostamente, desmatar um trecho da reserva ambiental da fazenda São Bernardo que, no caso, é justamente a propriedade onde residem o Vicente, seu irmão Baltazar e as respectivas famílias.

Na verdade, eles limparam o variante como forma de deixarem claros os limites da propriedade com relação aos vizinhos. O senhor João Gabriel viu nessa limpeza uma oportunidade para constranger o Vicente através do aparato estatal e obriga-lo a entregar a propriedade. O delegado de Buriti convocou o Vicente e perguntou-lhe sobre as árvores cortadas. “O senhor sabe que o André Introvini mandou cortar vários pés de bacuri?” soltou o Vicente. Na mesma hora, o delegado comentou que bacurizeiro, pequizeiro e babaçu são espécies imunes ao corte e que gostaria que o Vicente mostrasse os bacurizeiros caídos. Com essa declaração do delegado, ficou difícil para os Introvini desmatarem mais algum hectare nos povoados de Carrancas, Laranjeiras e Fazenda porque, afinal de contas, todas essas áreas estão cobertas de bacurizeiros, pequizeiros e pés de babaçu.

Em 2005, a Justiça Federal, a pedido do Ministério Publico de Buriti, suspendera as licenças concedidas pelo Ibama aos plantadores de soja no final de 2004. Os Introvini desobedeceram a determinação da justiça e começaram um desmatamento de 512 hectares no povoado Matinha. O STTR de Buriti denunciou o desmatamento e o MPE e a PM apreenderam os tratores.

As irregularidades com relação a fazenda São Bernardo não param por ai. Em 2013, Antônio Marques, empreiteiro da fazenda, morreu depois que os rins trancaram. Como ele não era funcionário oficial e sim terceirizado, a fazenda não se responsabilizou pelos custos do tratamento. Suspeita-se de contaminação por agrotóxico. Os trabalhadores da fazenda se submetem a rotinas desgastantes por receberem diárias de 30 reais e por trabalharem dez horas ao dia.

* Mayron Régis, Colaborador do EcoDebate, é Jornalista e Assessor do Fórum Carajás e atua no Programa Territórios Livres do Baixo Parnaíba (Fórum Carajás, SMDH, CCN e FDBPM).

** Crônica enviada pelo Autor e originalmente publicada no blogue Territórios Livres do Baixo Parnaíba.

Fonte: EcoDebate

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