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sábado, 4 de janeiro de 2014

Águas de Dezembro, artigo de Roberto Malvezzi (Gogó)

Chuvas gerais tem caído sobre o sertão nordestino. “Rios correndo, as cachoeiras tão zoando…”, como escrevia Zé Dantas em sua música com Gonzaga, chamada Riacho do Navio.


O ciclo das chuvas é essencial para o ciclo da vida. Todas as espécies de vida da caatinga – mais de 1200 só vegetais -, seus animais endêmicos e trazidos de fora, reagem à chegada das chuvas e a vida explode em sua plenitude.

Em Setembro fiz uma viagem de Juazeiro a Remanso – 200 km – e só vi água em Casa Nova por ter um braço do lago de Sobradinho e num povoado chamado Barragem, cujo pequeno açude nunca vi secar em meus 35 anos de sertão.

Repeti a viagem agora às vésperas do Natal e os riachos estão correndo, as barragens pegaram água, a caatinga em vários trechos está inundada e os animais pulam alegres pelas beiras das estradas. Estamos saindo da longa estiagem e voltando ao que se chama de período normal. Haverá muito o que recuperar e ainda precisamos de mais chuvas para encher os grandes açudes.

Por outro lado, no Espírito Santo, se fala na maior pluviosidade já registrada em 90 anos. Mais de 60 mil pessoas fora de suas casas, mais de 20 mortos. As estatísticas não podem medir o impacto emocional das grandes tragédias socioambientais. Pessoas que vivem em áreas de risco jamais tem paz quando o tempo de chuva se levanta. Esse é um estudo que a área de psicologia deveria fazer, isto é, os transtornos emocionais provocados pelos desastres socioambientais.

O mundo está mudando a olhos vistos. Não é preciso ser um cientista, embora a grande maioria dos cientistas admita que o processo não só está acontecendo, como traz consigo consequências incalculáveis. Nada, porém, que faça os donos da economia e da política refletirem sobre suas próprias práticas.

Há um grupo de cientistas que continua negando as mudanças climáticas, ou, se admite, afirma que elas não são de responsabilidade humana. A diferença entre esses cientistas e aqueles que nos alertam constantemente para a maior tragédia humana em andamento, não é de ordem técnica, mas ética. Os chamados céticos parecem não querer sequer aceitar o princípio da precaução. Quando não há ética, a técnica se torna serviçal de grandes interesses.

As águas de dezembro são benfazejas e trágicas. Estamos felizes no sertão, sem perder de vista – e sem perder o coração – com os impactados de Minas, Espírito Santo e Bahia.

Esses fatos obrigam aqueles que tem responsabilidades a prosseguirem nos caminhos da justiça, equidade e preservação da água para todos os seres vivos.

Roberto Malvezzi (Gogó), Articulista do Portal EcoDebate, possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Atua na Equipe CPP/CPT do São Francisco.

Fonte: EcoDebate

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