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quarta-feira, 27 de julho de 2016

O clima na era dos humanos, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

O planeta Terra foi formado há cerca 4,5 bilhões de anos. Os primeiros seres vivos (estromatólitos) datam de 3,8 bilhões de anos. Esses primeiros seres vivos eram bem simples.
Centenas de milhões de anos depois surgiram os organismos invertebrados. As esponjas foram os primeiros animais invertebrados a surgir na Terra, há 650 milhões de anos e há 520 milhões de anos surgiram os primeiros vertebrados. As grandes variações climáticas dificultavam a sobrevivência dos seres vivos.

Há 65,5 milhões de anos, época que marca o fim do período Cretáceo (K) e o início do Paleógeno (Pg) ocorreu uma grande extinção em massa da vida na Terra. A extinção “K-Pg” é muito conhecida devido ao desaparecimento dos dinossauros, mas vitimou também 75% das espécies. Isto ocorreu devido ao impacto de um asteroide com a Terra, o que ficou evidente com a descoberta de uma enorme cratera soterrada em Chicxulub, no Estado de Iucatã, México, medindo cerca de 180 quilômetros de diâmetro. O asteroide que caiu no México tinha mais de 10 quilômetros de diâmetro e o impacto dele com a Terra liberou energia equivalente a da explosão de cinco bilhões de bombas atômicas como as usadas sobre Hiroshima. A mudança abrupta do clima global levou à extinção total dos dinossauros e de grande parte da vida na Terra.

O período mais quente dos últimos 500 milhões de anos aconteceu no chamado “Máximo Térmico do Paleoceno-Eoceno” (MTPE ou PETM em inglês). Em apenas 20 mil anos, a temperatura média terrestre aumentou em 6º C, com um correspondente aumento do nível do mar, bem como um aquecimento dos oceanos. As concentrações de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera aumentaram significativamente, provocando escassez de oxigênio nas profundezas oceânicas, provocando grandes extinções de vida marinha. Durante o MTPE foram liberadas nos oceanos e na atmosfera entre 1.500 e 2.000 gigatoneladas de carbono num lapso de tempo de mil anos, o que é equiparável às atuais emissões antrópicas.

A partir do Máximo Térmico do Paleoceno-Eoceno (MTPE) as temperaturas começaram a cair continuamente até ficar abaixo do nível atual. O gênero Homo, que inclui os humanos modernos, surgiu a cerca de 2,5 milhões de anos, evoluindo de ancestrais australopitecíneos e o surgimento do Homo habilis. Nota-se que o gênero Homo surgiu e evoluiu em um clima com temperaturas iguais ou menores do que as atuais. Nestes 2 a 3 milhões de anos houve diversos períodos glaciais e interglaciais que variavam entre 10 e 15 mil anos, sendo que, na maioria do tempo, o clima oscilava entre zero e cerca de 4º C para baixo. Mas também houve pequenos períodos em que a temperatura ficou acima da média do século XX.

O Homo Sapiens surgiu na África há cerca de 200 mil anos, se espalhando pelo Planeta por volta de 90 mil anos atrás. Enquanto o Homo Sapiens ainda estava na África tropical, ocorreu o período Eemiano, entre 130.000 e 110.000 anos, sendo o último período interglacial antes do Holoceno, no qual o clima era mais quente do que o de hoje e o nível do mar estava entre 5 a 6 metros mais alto do que o nível atual.

Entre 350 mil e 20 mil anos atrás, também habitou a Terra o homem de Neandertal que viveu na Europa e partes do oeste da Ásia. Eles coexistiram no tempo com o Homo sapiens, mas com poucos contatos, embora os neandertais compartilhem 99,7 por cento de seu DNA com os humanos modernos, apesar de apresentarem diferenças morfológicas muito específicas. Os Neandertais foram extintos no último período glacial que ocorreu após o período Eemiano.

O Último período glacial, também conhecido como Idade do Gelo, ocorreu durante a última parte do Pleistoceno, de aproximadamente 110.000 a 10.000 atrás. Esta glaciação foi a última acontecida na Terra, marca fim do período Pleistoceno e foi quando o aumento do gelo permitiu a travessia (Estreito de Bering) do ser humano da Ásia para a América do Norte. Um evento que quase exterminou os seres humanos foi a “catástrofe de Toba”, que ocorreu de 70 mil a 80 mil anos atrás, em decorrência de um evento vulcânico no Lago Toba, em Sumatra, na Indonésia, que pode ter reduzido a população humana mundial a algo em torno de 10 mil pessoas. Foi no período mais frio do último período glacial que os Neandertais foram extintos.

Mas o clima mudou com o fim do Pleistoceno e o início do Holoceno. A temperatura subiu e se manteve surpreendentemente estável nos últimos 10 mil anos, com uma variação de 0,5º C para cima ou para baixo da média do século XX. Foi nesse período que houve o grande avanço da história humana. A estabilidade climática foi fundamental para o sucesso da Revolução Agrícola e o avanço da pecuária que possibilitou a vida sedentária, o surgimento das cidades e o avanço da escrita e da civilização.



Segundo Jared Diamond, no livro “Armas, Germes e Aço” a cultura floresceu no período Neolítico, cerca de 8.500 a.C., iniciando-se com a domesticação de plantas e animais, em função da alta fertilidade do solo e do ecossistema do Crescente Fértil (região da Mesopotâmia e Oriente Médio). Excedente de alimentos, aumento populacional, sedentarismo, mais gente para pensar, inovações tecnológicas, exploração dos metais, fabricação de armas, excedente de produtos agrícolas e de animais, aumento das trocas (escambo), surgimento do comércio, invenção da roda e da escrita, formação de aldeias e cidades, organização política, tudo isso, permitiu um grande avanço do tamanho da população e da melhoria das condições de vida.

Assim, é necessário reforçar que o Holoceno (últimos 10 mil anos) foi um período de grande estabilidade climática e que manteve temperaturas abaixo do período Eemiano (entre 130.000 e 110.000 anos) e acima do último período glacial (entre 110.000 a 10.000 atrás). Porém, esse período excepcional, em que o clima ajudou o desenvolvimento humano, está chegando ao fim, exatamente pelo poder exponencial das atividades antrópicas.

O gráfico abaixo mostra que a concentração de CO2 na atmosfera variou de 185 a 280 partes por milhão (ppm) nos últimos 800 mil anos, antes da Revolução Industrial e Energética. A variação de CO2 na atmosfera é a principal responsável pela mudança da temperatura entre os períodos mais quentes e os períodos glaciais.



Após o início do uso generalizado dos combustíveis fósseis (carvão mineral, petróleo e gás) a concentração de CO2 na atmosfera subiu para 400 ppm em 2015, acelerando o aquecimento da atmosfera. Isto quer dizer que o clima na Terra deve voltar para o nível do período Eemiano que estava pelo menos 2º C acima da média do século XX e o nível do mar estava entre 5 e 6 metros acima do nível atual.

Com a crescente emissão de gases de efeito estufa (GEE), o clima na Terra caminha para um nível sem precedentes nos últimos 3 milhões de anos. Se as emissões de GEE continuarem a temperatura do Planeta pode chegar a 4,5º C acima da média do século XX (cerca de 5º C acima da média do Holoceno) até 2100. Isto levaria à elevação do nível dos oceanos e à inundação de amplas áreas costeiras, inclusive de grandes cidades ao redor do mundo, afetando diretamente a vida de pelo menos 500 milhões de pessoas.

O gráfico mostra que existe uma relação muito forte entre as emissões de carbono e o aumento da temperatura global. Entre 1880 e 1900 a temperatura estava 0,2oC abaixo da média da temperatura do século XX. Entre 1901 e 1950 a média da temperatura ficou 0,15oC abaixo da média do século passado e entre 1951 a 2000 ficou 0,15oC acima da média. Portanto, houve um aumento de temperatura, mas que alguns céticos consideravam como efeito natural.

Porém, o ano de 1998 foi o mais quente do século XX e ficou 0,63oC acima da média secular. E o que estava ruim, piorou muito no século XXI, pois a temperatura em 2015 ficou 0,90oC acima da média do século XX, um acrescimo de 0,27oC em apenas 17 anos. Para os incrédulos, e surpreendentemente, os três primeiros meses de 2016 tiveram um aumento climático extremamente elevado, não antecipado por ninguém e nenhum modelo estatístico. O aumento da temperatura em relação à média do século XX foi de 1,04oC em janeiro, de 1,21oC em fevereiro e de 1,22oC em março de 2016, segundo dados da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA). Ou seja, em relação ao final do século XIX, o aumento da temperatura no primeiro trimestre de 2016 ficou quase 1,5oC mais elevada, o que é a meta de limite máximo de aumento da temperatura proposta pelo Acordo de Paris para o ano de 2100. No primeiro semestre de 2016 a temperatura ficou 1,05º C. acima da média do século XX. É a primeira vez que se registra um semestre com temperatura acima de 1º C. Tudo isto acendeu o alerta e os ambientalistas estão falando em emergência climática.

Mesmo que o Acordo de Paris, da COP-21, seja colocado em prática, a temperatura pode chegar a 3,5º C acima da média do século XX e 4º C acima da média do Holoceno. As consequências seriam desastrosas de qualquer maneira. No caso de a temperatura ficar em 2º C acima da média do século XX até 2100 já seria problemático. E o pior é que o aumento deve continuar no século XXII. Isto quer dizer que o futuro da civilização está em sério perigo.

Em artigo publicado mês passado no periódico Atmospheric Chemistry and Physics Discussion, o cientista James Hansen e colegas (2016) confirmam que o aumento da temperatura em 2ºC pode ser extremamente perigoso, pois pode gerar super-furacões e elevar o nível do mar, no longo prazo, em vários metros, ameaçando as áreas costeiras em geral, especialmente as mais povoadas.



Ou seja, desde o surgimento do gênero Homo, há cerca de 2,5 milhões de anos, o clima nunca ficou tão quente como se projeta para o final do século XXI. Será pior no século XXII. Na maior parte de sua história, o Homo Sapiens viveu em temperaturas menores do que as atuais. O clima atual é uma situação totalmente atípica e que a humanidade nunca viveu desde que desceu das árvores e passou a derrubá-las. Uma súbita mudança climática pode levar a civilização ao colapso.

Para mudar este quadro, libertar-se dos combustíveis fósseis é essencial. Porém, está cada vez mais evidente que não basta mudar a matriz energética, descarbonizar a economia e promover uma maquiagem verde no processo de produção e consumo. É preciso, urgentemente, colocar na ordem do dia o debate sobre os meios de se promover o decrescimento das atividades antrópicas. A meta de redução da pobreza deve ser alcançada pelo decrescimento das desigualdades sociais e não pelo crescimento econômico desenfreado.

Como afirmei em outro artigo: a economia depende da ecologia e não o contrário. Os desastres, geralmente, não são naturais, já que o maior desastre em curso é o aquecimento global provocado pelas exponenciais emissões de gases de efeito estufa. Não é a natureza que está ameaçando o ser humano. O ser humano está se autodestruindo ao aquecer a temperatura do Planeta. E o pior é que muitas espécies inocentes podem desaparecer no Antropoceno devido à irresponsabilidade e ganância humanas.

Referências:

Carbon Story

Climate Scoreboard – UN Climate Pledge Analysis

DIAMOND, Jared Mason. Armas, Germes e Aço: os destinos das sociedades humanas. Rio de Janeiro: Record, 11ª ed. 2009. Armas germes e Aço 1/3 – Saindo do Jardim do Éden

Climate Central. See Earth’s Temperature Spiral Toward 2°C, May 9th, 2016

History of atmospheric carbon dioxide from 800,000 years ago until January, 2014.

The North Greenland Eemian Ice Drilling – NEEM

HANSEN, J et. al. Ice melt, sea level rise and superstorms: evidence from paleoclimate data, climate modeling, and modern observations that 2°C global warming could be dangerous. Atmos. Chem. Phys., 16, 3761–3812, 2016



José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

Fonte: EcoDebate

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