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quarta-feira, 6 de julho de 2016

Consumo consciente, Parte 1/4, artigo de Roberto Naime

ALENCASTRO et. al. (2014) ressaltam os padrões insustentáveis de produção e consumo e apresentam alguns questionamentos no que se refere à possibilidade de práticas de consumo mais conscientes.


Trata-se de uma reflexão crítica sobre as contradições presentes no discurso do consumo consciente, num contexto de uma sociedade que se torna cada vez mais consumista.

O cenário é um ambiente no qual o marketing excessivo e os mecanismos de mercado passam a exercer um papel cada vez mais relevante nos processos de estruturação das relações sociais.

A questão da mudança dos padrões insustentáveis de produção e consumo é focalizada em diversos pontos da Agenda 21. Assim sendo, a busca de alternativas que reduzam as pressões ambientais e atendam às necessidades básicas da humanidade são objetivos a serem atingidos por todos os que estão comprometidos com questão ambiental.

Ao longo das últimas décadas têm surgido alterações no posicionamento da sociedade face ao ambiente, resultantes da tomada de consciência, graças a um maior conhecimento do tema e uma maior participação pública.

Essa tomada de consciência, face ao ambiente, originou o reposicionamento dos agentes econômicos que estão adaptando uma atitude preventiva em detrimento de uma atitude corretiva, com vista ao desenvolvimento sustentável e no novo padrão de consumo.

Devido a esta metamorfose, defende-se a era da diferenciação dos produtos por meio de uma proposta mais humanitária, que chegue com facilidade ao íntimo de cada indivíduo. Toda essa conciência ganhou forma quando se começou a falar e perceber o real significado das catástrofes que podiam assolar o nosso planeta.

ALENCASTRO et. al. (2014) assegura que esta situação se origina no novo padrão de consumo, que deverá dar as diretrizes de um novo modelo de consumo, ou seja, o consumo consciente para esta segunda década do século XXI (BERTÉ, 2013. pg 39-40).

O modelo capitalista do pós-guerra, que haveria de se tornar hegemônico em grande parte do mundo, estava baseado na noção de progresso com desenvolvimento econômico a partir de recursos naturais infinitos e que seriam regulados pelo livre mercado.

Isto traria o bem-estar dos povos e nações. Não é difícil perceber que se vive hoje num mundo de opulência sem precedentes, inimaginável há um ou dois séculos atrás.

Também é muito fácil observar que ao lado de todo esse progresso material convive-se com privação, pobreza e ameaças cada vez mais graves ao meio ambiente e à sustentabilidade da própria vida econômica e social, aliás, problemas que podem ser encontrados tanto em países ricos como pobres (SEM, 2000, p. 9-10).

A autopoiese sistêmica dominante necessita ser alterada. Pois hoje só o consumismo garante a manutenção dos círculos virtuosos da sociedade. Aumento de consumo gera maiores tributos, maior capacidade de intervenção estatal, maior lucratividade organizacional e manutenção das taxas de geração de ocupação e renda. O consumismo precisa ser substituído pela idéia de satisfazer as necessidades dentro de ciclos.

Pois hoje só o consumismo garante a manutenção dos círculos virtuosos da sociedade. Aumento de consumo gera maiores tributos, maior capacidade de intervenção estatal, maior lucratividade organizacional e manutenção das taxas de geração de ocupação e renda. O consumismo precisa ser substituído pela idéia de satisfazer as necessidades dentro de ciclos.

Um outro mundo é possível, mesmo dentro da livre iniciativa. Ocorre enfatizar que nada é contra a livre-iniciativa. Que sem dúvida sempre foi e parece que sempre será o sistema que melhor recepciona a liberdade e a democracia. Mas uma nova autopoise sistêmica para equilíbrio do arranjo social, é urgente. Interpretando autopoiese numa tradução de sentido livre e ampla da concepção.

O modelo atual de desenvolvimento econômico vem gerando enormes desequilíbrios sociais. Em outras palavras, nunca houve tanto crescimento, riqueza e fartura ao lado de tanta miséria, degradação ambiental e poluição. É neste cenário que se encaixa o desenvolvimento sustentável, como uma maneira de equilibrar e dar continuidade a atividades essenciais a qualidade de vida.

É neste cenário que surgem os ideais sobre o desenvolvimento sustentável. (ARAÚJO et al., 2006, p.3). O capital necessita dos desejos e das necessidades humanas para crescer. Desde os primórdios das Revoluções Industriais descobriu-se que o ser humano não quer apenas o necessário. Tendo condições, deseja também o supérfluo e, desta forma, a mercadoria passou a ter o status de objeto de desejo, de fetiche. É o desejo humano, enfeitiçado pelas mercadorias, que aumenta o consumo destas mesmas mercadorias.

Dessa forma, o consumo “produz” a produção, numa espécie de “círculo da manipulação e da necessidade retroativa” (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 114) na qual os bens padronizados são disseminados para suprir as necessidades dos consumidores e são aceitos sem resistência, já que essas necessidades partem dos próprios consumidores. Quanto mais veloz é o giro dessa “roda de consumo” melhor para o sistema.

O objetivo é mantê-la girando. Para isso, é necessário criar cada vez mais novos hábitos de consumo e, quase tudo que é comprado o é por ter sido divulgado na mídia. Se não foi por este meio que se conheceu o produto adquirido, certamente é de alguém que pertence a um determinado grupo que comprou o produto. Consome-se, então, por “inveja” ou pela sensação de pertencer a um determinado grupo de pessoas, que têm o poder de adquirir o produto para consumi-lo.

Consumir passou a ser um processo de inserção social. Consumir é existir! André Gorz na sua Crítica da razão econômica, afirma que os indivíduos já estão persuadidos, pela publicidade comercial, a desenvolver padrões de consumo que lhes compensem “largamente os sacrifícios que devem aquiescer para obtê-los e que eles constituem um nicho de felicidade privada que permite escapar da sorte comum” (2003. p.111).

O mercado assume, agora, a função de determinar os comportamentos. É ele quem determina o que é certo ou errado, quem define os hábitos e, consequentemente, a moral a ser seguida. Para BAUMANT (2008), o mercado é o espaço social no qual a sociedade humana se desenvolve, sendo que os padrões de conduta são inspirados e moldados por ele.

Neste contexto as pessoas são ao mesmo tempo produtoras de mercadorias e são mercadorias propriamente ditas. Os padrões de produção e consumo ditados pelo atual modelo econômico representam quase que uma “impossibilidade matemática”, tal como apontada pelo sócio-biologista Edward O. Wilson (apud DUPAS, 2001, p. 56.), que alertou para o fato de que se fosse possível elevar ao nível médio norte-americano a qualidade de vida da população atual da Terra, seriam necessários os recursos naturais de mais dois planetas.

O progresso econômico, no entanto, mostrou que os recursos naturais não eram inesgotáveis e “a economia, ao desprezar os recursos vivos, se condena a não passar de uma ciência das coisas mortas” (MARÉCHAL, 1993. p. 11).

Classificar o meio ambiente como “externalidade” gerou esgotamento científico desta manipulada matriz econômica.

Referências:

ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max. A dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. p.114.

ALTVATER, Elmar. O preço da riqueza. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1995.

BAUMANT, Zygmunt. Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Política Nacional dos Resíduos Sólidos. Disponível em: < http://www.mma.gov.br/politica-de-residuos solidos>. Acesso em: 23/06/2014.

BERTÉ, Rodrigo. Gestão Socioambiental no Brasil: uma análise ecocêntrica. Editora Intersaberes, 2013: Curitiba – PR

DE ARAÚJO, Geraldino Carneiro et al. Sustentabilidade empresarial: Conceito e indicadores. Anais do 3 Congresso virtual brasileiro de administração. 2006. 3 Ver http://adbusters.org/home/

DEMO, Pedro. Metodologia científica em ciências sociais. 3.ed. São Paulo: Atlas, 1995. p. 249.

DE OLIVEIRA CLARO, Priscila Borin; CLARO, Danny Pimentel; AMÂNCIO, Robson. Entendendo o conceito de sustentabilidade nas organizações. Revista de Administração da Universidade de São Paulo, v. 43, n. 4, 2008.

DUPAS, Gilberto. Ética e poder na sociedade da informação: de como a autonomia das novas tecnologias obriga a rever o mito do progresso. 2.ed. São Paulo: Editora UNESP, 2001.

FURTADO, Celso. O mito do desenvolvimento econômico. 2.ed. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1998

GORZ, André. Metamorfoses do trabalho: crítica da razão econômica. São Paulo: Annablume, 2003.

LEFF, Enrique. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Rio de Janeiro: Vozes, 2001.

LIPOVETSKY, G. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. São Paulo: Cia das Letras, 2009.

MARCUSE, Herbert. A ideologia da sociedade industrial: o homem unidimensional. 4. ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1973. p. 24 e 27.

MARÉCHAL, J.P. A economia, o emprego e o meio ambiente: o racional e o razoável. Lisboa: Instituto Piaget, 1993.

MONTIBELLER FILHO, Gilberto. O mito do desenvolvimento sustentável: meio ambiente e custos sociais no moderno sistema produtor de mercadorias. Florianópolis: Ed. UFSC, 2004.

PÁDUA, José Augusto de. Valores pós-materialistas e movimentos sociais: o ecologismo como movimento histórico. In: UNGER, Nancy Mangabeira (Org.). Fundamentos filosóficos do pensamento ecológico. São Paulo: Edições Loyola, 1992.

SEM, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

ALENCASTRO, Mario Sergio Cunha. EBERSPACHER, Aline Mara Gumz. KRAETZ, Guisela Kraetz. BERTÉ, Rodrigo. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E CONSUMO CONSCIENTE: ALGUMAS
REFLEXÕES Revista Meio Ambiente e Sustentabilidade. Ed. Especial, vol. 7, n. 3, p. 738 – 752, jul – dez 2014



Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.

Fonte: EcoDebate

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