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sexta-feira, 22 de maio de 2015

Barragens Subterrâneas Amenizam Efeitos da Seca no Semiárido

Saindo de Recife e adentrando pelos estados de Pernambuco e Alagoas, a paisagem dominante era a da vegetação seca sob o sol inclemente do semiárido: alguns poucos cultivos de mandioca e palma subsistiam em meio à caatinga e desafiavam o clima seco. Chegamos então à propriedade de Seu Dedé, no pequeno município de São José da Tapera, em Alagoas.


O contraste era visível: dentro de seu terreno, as plantações de coentro, alface, aipim, milho e feijão eram todos de um verde muito vivo. Ao ser questionado sobre como ele conseguia plantar tantos alimentos durante o período de seca, Seu Dedé deu um sorriso largo e disse que nunca faltava água em sua propriedade: ele possuía uma barragem subterrânea.

“É muita água, agora todos os meus vizinhos, do micro ao médio produtor, querem construir uma barragem, e eu tenho a receita”, diz Seu Dedé feliz. “Construí a primeira em 2008, a segunda barragem, que fiz em 2014, foi feita com o dinheirinho que consegui com a primeira.”

A barragem é uma tecnologia popular, não foi criada pela Embrapa. Existem registros de barragens há mais de dois séculos. A Empresa pesquisa sua utilização há 30 anos. Ela é uma tecnologia de captação da água da chuva que contribui para o convívio dos sertanejos com o Semiárido, proporcionando a produção de água para a atividade agropecuária e diminuindo os riscos da agricultura dependente de chuva. A barragem está presente em todos os estados do Semiárido, incluindo o Norte de Minas Gerais.

Com a adoção das barragens subterrâneas, as famílias conseguem armazenar água suficiente para manter sua produção. A barragem é uma parede construída para dentro da terra, que tem a função de barrar as águas das chuvas que escorrem no interior e acima do solo, formando uma vazante artificial onde os agricultores ficam com o terreno molhado entre três e cinco meses após a época chuvosa, permitindo a plantação, mesmo em época de estiagem, de culturas de subsistência, fruteiras, forragem, hortaliças, plantas medicinais, cana-de-açúcar, batata doce, arroz, etc.

“A experiência com barragens subterrâneas comprova que ela contribui para a segurança alimentar e nutricional das famílias agricultoras, bem como para a geração de renda a partir da comercialização dos produtos nas feirinhas agroecológicas”, diz a pesquisadora da Embrapa Solos Maria Sonia Lopes da Silva. A barragem também diminui a demanda por produtos externos à propriedade, como alguns alimentos, fitoterápicos e pequenos animais”, completa. Outro fator importante é proporcionar às famílias maior poder aquisitivo e acesso a bens de consumo.

Crise Hídrica

Considerando que a barragem subterrânea é uma das tecnologias mais indicadas para produção de alimentos em áreas com escassez de chuva, ela é uma alternativa viável para produção de alimentos. Em Petrolina (PE), por exemplo, graças às barragens, conseguiu-se produzir sorgo sacarino (importante gramínea utilizada na alimentação animal), com uma precipitação total média no período de cultivo de 100 dias de apenas 200mm.

“A grande vantagem da barragem subterrânea é que ela guarda água dentro do solo, elevando o lençol freático. Elas têm sido implantadas em vários estados do Nordeste, com o objetivo de produção de alimentos para a família”, conta a pesquisadora da Embrapa Semiárido (Petrolina-PE) Roseli Freire de Melo.

O sucesso da tecnologia no Semiárido não permitiria sua adoção em outras regiões do Brasil? Roseli responde: “é importante lembrar que a barragem subterrânea é uma tecnologia utilizada no Semiárido, onde a média anual de precipitação pluviométrica varia entre 200 a 800mm. No entanto, em lugares com precipitação acima de 800 mm a barragem pode não funcionar, pois o excesso de água pode comprometer sua estrutura”.

A Voz do Campo

Em Ouricuri (PE), Dona Jesuíta, do Sítio Maniçoba, conheceu a experiência da barragem subterrânea em uma oficina de intercâmbio. Com a ajuda de entidades sociais locais, construiu a sua própria: “depois da barragem subterrânea a nossa propriedade ficou completa, pois a gente já tinha água pra beber e dar pros animais em duas cisternas. Faltava água para plantar, agora não falta mais nada. No começo, a gente não acredita muito nela, porque não vê a água em cima da terra, mas depois que a gente deixa de comprar um monte de coisa porque tira do plantio feito nela, a gente fica é querendo ter mais terra pra construir mais barragens”, enfatiza Dona Jesuíta.

Pelas palavras de Dona Sônia, agricultora de Buíque (PE), que tem uma barragem subterrânea com parede de 30 metros de comprimento, nota-se que os objetivos da tecnologia foram alcançados. “Minha gente, vou ser sincera com vocês: a minha barragem, como vocês podem ver, só não tem no momento feijão, milho e as hortaliças que costumo plantar, pois a terra tá muito seca em cima, mas as frutas… Vejam que belezura de mamão, graviola, laranja, limão, manga, acerola, banana, goiaba e um monte mais, vocês acham que eu teria isso aqui se não fosse a minha barragem? Olhem o resto da propriedade, não tem nada, não choveu! Aqui tem porque tenho irrigado com a água do poço da barragem”.

Reconhecimento

O trabalho da Embrapa Solos com as barragens recebeu dois importantes prêmios em 2013: o Prêmio Mandacaru – Projetos e Práticas Inovadoras em Acesso à Água e Convivência com o Semiárido e a certificação como tecnologia social pela Fundação Banco do Brasil (FBB)

O Prêmio Mandacaru tem foco no reconhecimento de pesquisas desenvolvidas no Semiárido brasileiro em gestão de recursos hídricos, e é concedido pelo Instituto Ambiental Brasil Sustentável – IABS.

Já certificação concedida pela FBB acontece a cada dois anos. Desde 2001, por meio do Prêmio, a Fundação BB identificou, premiou e certificou como tecnologia social diversas iniciativas que hoje compõem o Banco de Tecnologias Social, uma base de dados online com mais de 500 tecnologias sociais disponíveis para consulta.

Segundo estimativas da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) existem mais de 1.500 barragens no Semiárido. “Todas georeferenciadas e monitoradas, revela Antonio Barbosa, coordenador do Programa Uma Terra e Duas Águas, da ASA.

Fonte: EcoDebate

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