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terça-feira, 3 de dezembro de 2013

O ‘evangelho’ segundo o agronegócio, crônica de Mayron Régis

Para cada comunidade havia uma recompensa. Ele só precisava abatê-las antes de aprenderem a voar. Assim que chegavam no Baixo Parnaíba, os plantadores de soja ou de eucalipto convocavam o Pedrão. Ele mantinha uma lista particular das várias comunidades que abatera. Não conhecia a derrota naquelas Chapadas de Urbano Santos, Anapurus, Santa Quitéria e Barreirinhas.

O agronegócio o salvara da miséria e da fome no final dos anos 90 quando começaram os primeiros plantios de soja em Anapurus. O Pedrão administrava uma fazenda na qual plantava arroz e milho. Seu sustento, contudo, ele tirava dos desmatamentos das Chapadas e a produção de carvão vegetal nas baterias de carvoarias. Os plantadores de soja e de eucalipto reconheciam o seu jeito para lidar com as comunidades.

Ele missionava as comunidades para o agronegócio. O agronegócio o salvara, mas o seu propósito não era salvar ou educar ninguém. Salvaria a própria pele, antes de salvar a de outra pessoa. Andava sempre só ou no máximo com sua mulher na garupa. O evangelho que pregava passava ao largo das palavras de justiça e respeito ao próximo. O seu evangelho prosperava a qualquer preço. Por onde se andasse pelo Baixo Parnaíba maranhense, via-se a expressão desse evangelho. Ou, melhor dizendo, via-se o desmatamento de bacurizeiros e de pequizeiros.

O evangelho de Pedrão aboliu a carne, afinal os moradores não soltavam mais seus animais sobre as Chapadas porque os empregados do plantador de soja os matavam. O evangelho de Pedrão aboliu a carne, afinal os moradores não mais despregavam as carnes dos caroços de bacuri para guardarem e depois venderem-nas para os compradores que viriam de cidades próximas. O evangelho de Pedrão aboliu a carne e com isso desabitou as Chapadas e os Baixões de boa parte do Baixo Parnaíba maranhense.

Esse evangelho dispensa habitações e, em consequência, dispensa pessoas para que se consagre.

Pedrão e seus patrões obtiveram inúmeros sucessos. Por baixo, eles abateram as Chapadas de umas cinco comunidades nas bacias dos rios Preguiça e Munim. Eles abatiam as Chapadas para manterem seus ritmos de vida. O senhor Loeff, patrão do Pedrão em 2005, pagou R$ 150 mil pela fazenda São Raimundo, em Urbano Santos. O desmatamento da Chapada e a produção de carvão vegetal renderiam quanto para eles? O suficiente para cobrir os seus gastos por algum tempo.

O evangelho de Pedrão escamoteava o que, realmente, queria-se com aquela Chapada. Eles visavam o dinheiro da indústria do ferro-gusa e dos bancos que financiam os plantios de soja e de eucalipto. Como a comunidade de São Raimundo não permitiu o desmatamento, os caras nem viram e nem sentiram o cheiro do dinheiro da indústria de ferro-gusa e dos bancos.

O evangelho de Pedrão depois dessa derrota nunca mais foi o mesmo. Ele jogou uma conversa para o presidente da Associação do Povoado da Jurubeba, município de Barreirinhas. Nessa conversa, o Pedrão prometia que o André, seu atual patrão, daria para a comunidade um campo agrícola e só bastava que a comunidade aceitasse o desmatamento da Chapada. O seu Chico Patrocínio respondeu “Pode esperar sentado”.

* Mayron Régis, Colaborador do EcoDebate, é Jornalista e Assessor do Fórum Carajás e atua no Programa Territórios Livres do Baixo Parnaíba (Fórum Carajás, SMDH, CCN e FDBPM).

** Crônica enviada pelo Autor e originalmente publicada no blogue Territórios Livres do Baixo Parnaíba.

Fonte: EcoDebate

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